É uma verdade quase
universalmente reconhecida que, uma história clássica como “Orgulho e
Preconceito”, em domínio público, permanecerá sendo lida, relida e remexida ao
longo dos anos.
E
não faltam adaptações que nos levam de volta de tempos em tempos ao universo
criado por Jane Austen, fazendo desta história algo tão presente após 200 anos.
São livros, séries, filmes, de diversas abordagens, estilos, tramas, que vão de
viagem no tempo a zumbis até – sempre, claro, a manter alguma essência do
enredo principal.
Tá por fora dessas adaptações?
Orgulho
e Preconceito (filmes)
O
Diário de Bridget Jones (livros e filmes)
Lost in Austen (livro e série)
Noiva
e Preconceito (filme)
O
diário de Mr. Darcy (livro)
Morte
em Pemberley (livro e série)
Austenlândia
(livro e filme)
As
Sombras de Longbourn (livro)
Orgulho
e Preconceito e Zumbis (livro e filme)
Diante
de tantas referências, é difícil trazer algo novo ou tão surpreendente – difícil, não impossível, pois o que a
websérie The Lizzie Bennet Diaries
(TLBD) prova é que tudo depende de como a história é contada. Nesta série, o
chamado storytelling leva a ficção
aos seus mais longínquos limites ao quase nos fazer acreditar que a história é
verdadeira. Aqui nossos queridos personagens de Orgulho e Preconceito (OeP)
foram transportados do século XIX para o século XXI, na era da informação e das
redes sociais, sem deixar para trás suas personalidades ou conflitos. Eles
“ganham vida” como nunca, fazendo desta produção uma releitura impressionante e
sem igual.
E
não para por aí!
Não
é uma série comum, em que assistimos toda a dinâmica da história pela telinha –
na verdade, em computadores, sistemas androids ou smart tvs, já que o conteúdo
está na web. Quando se diz que os
personagens “ganham vida”, eles “ganham vida” mesmo. Eles são de carne e osso, falam como a gente,
têm (e usam!) redes sociais, têm gostos pessoais, dentre outras coisas, como
uma pessoa comum.
Toda
a ação da série, aliás, utiliza-se do roteiro da trama original. Adentramos na
história a partir dos vídeos de Lizzie Bennet, a protagonista, uma estudante de
comunicação que lança um canal para pautar um estudo, que será sua tese. E isso
fica ainda maior, pois temos outros personagens com perfis no meio virtual (com
interações até!), que funcionam como outros pontos de vista complementares à
série. Essa experiência midiática é o
que chamamos de transmídia – uma
história que é contada em diversas mídias diferentes, de maneira que cada uma
contribui com uma parte para o todo. Além do meio audiovisual dos canais no
Youtube (de Lizzie, Lydia, outros), temos microblogs de textos e imagens, em
atividades pelo Twitter, Facebook, Tumblr e até Pinterest.
Só
quem pegou a websérie no ar na época sabe o que é duvidar da realidade ao ver
Lizzie e companhia tuitando na timeline.
Não a toa a produção ganhou um Emmy Award
por Programa Interativo Original.
Apesar
de toda essa interatividade na web, a produção deu seu toque final quando
transformou um elemento da série em um precioso “item de colecionador”. Em
extensão à experiência transmídia, surgiram livros! O diário secreto de Lizzie Bennet
é este componente essencial, mencionado na série, que guarda grandes segredos
do universo TLBD, e As épicas aventuras de Lydia Bennet é o livro que encerra a
série, nos dando a oportunidade de um último adeus às irmãs Bennet.
Ao
contexto do Clube de Abril, que tem por tema “perfil que virou livro”, O
diário de Lizzie Bennet se
encaixa de maneira excelente por toda essa bagagem de interatividade e por ser
de fato, um perfil (vlog) que virou livro. Ao mesmo tempo que traz uma
adaptação de um clássico, concentra todo um panorama que retrata nosso momento virtual,
as relações de interatividade, as circunstâncias de produção de conteúdo, o
fenômeno intrínseco ao mundo dos youtubers, a recepção de variados fandons, sem falar do quanto nos leva a
extrapolar os limites e entendimento
da ficção. É, de fato, uma obra que tem muito para dialogar.
O leitor, a propósito,
pode se preparar de várias maneiras para o Clube de Abril. Como se pode
ver, há diferentes níveis de envolvimento – que começa pela websérie e se fecha
pelos livros. Vez que a leitura (nos encontros mensais) não é obrigatória, é
possível assistir apenas à série, senão o inverso, ler o livro sem acompanhar a
série. É recomendado os dois juntos para
que se tenha uma melhor experiência desta manifestação transmídia, claro.
A
websérie é bem acessível, está disponível no Youtube e possui legendas em
português. Na playlist
oficial, são 100 episódios pelo canal da Lizzie Bennet, afora canais
complementares (os chamados spin-offs)
de outros personagens. Os episódios são
bem curtinhos, de 3 a 5 minutos, garantindo uma imersão rápida digna de
maratona. Para assistir, postamos um tutorial no nosso instagram (acesse
Destaques – veja TLBD serie) de
maneiras de como acompanhar e como ativar legendas. Esse tutorial vai ficar
disponível apenas neste mês de abril.
Quanto
às interatividades, se você é curioso para ver, a produção Pemberley Digital
preparou um conteúdo demonstrativo especial para os fãs. Acontece que a série
completou 5 anos (foi de 2012 a 2013) e ganhou uma reprise #LBD5Year, que acabou
recentemente. As interações do Twitter foram transmitidas em pequenos vídeos,
junto a outras imagens, no perfil @thelbdofficial
(instagram). São postagens tanto para se encantar quanto para deixar o coração
dos fãs na mão.
Você
também pode conferir a reação do fandom
na página
da série, onde os vídeos foram postados em reprise, e ainda se conectar com
essa galera, senão na página, no grupo
de facebook.
Sem dúvidas, no último
vídeo as emoções devem novamente chegar a seu ápice. Mas a impressão que fica,
agora que a série chega ao final, é que TLBD talvez seja uma das séries que
mais envolveu seu público, mantendo-se o tempo todo nas mentes dos fãs. E como
uma vez que algo cai na web, daqui nunca sai, muita gente ainda descobrirá a
série. É certo que talvez o envolvimento (e vício) não seja tão grande como o
de quem acompanhou tudo em tempo real, mas não haverá como não se divertir com
Lizzie, Lydia e companhia , ou deixar reconhecer a qualidade do trabalho feito
pela equipe de Hank Green e Bernie Su. Bruna Romão, do fandom,
aqui.
A
lembrar, não é preciso ler Orgulho e Preconceito para
compreender O diário secreto de Lizzie Bennet. Apesar de seguir o roteiro
da história clássica, o enredo se expande. São muitas referências para além da
obra austeniana, com cultura pop e fatos mundiais. Algumas destas referências,
reunimos abaixo, em curiosidades – no
máximo da lei antispoiler que conseguimos ser!
Curiosidades sobre o
universo TLBD
Pemberley
Digital existe
-
No livro, Pemberley Digital é uma empresa de comunicação, de experimentos e desenvolvimento de conteúdos em novas mídias. No real, é a
produtora da websérie, especializada em adaptações de clássicos para um novo
formato. Além de Orgulho e Preconceito, também já adaptaram Lady Susan (Welcome
to Sanditon), Emma (Emma Approved), Frankenstein (Frankenstein MD) e
Mulherzinhas (The March Family Letters). Para mais informações, acesse www.pemberleydigital.com
VidCon
e Vlogbrothers também existem
-
No livro, Lizzie fala sobre eles brevemente, mas se trata de uma grande
referência para o contexto da ficção e da realidade. A VidCon é a maior
conferência de vídeo bloggers, uma convenção que reúne muita informação sobre
Youtube, conteúdo, interatividade, etc; já o Vlogbrothers é um dos grandes canais conhecidos nesse meio, feito
pelos irmãos Green – Hank e John Green
(sim, o escritor). Eles partiram da ideia de enviar vídeos um para o outro
contando novidades, já que moram longe um do outro, e ao postar esses vídeos na
internet, a brincadeira acabou ficando maior do que o esperado. Falam sobre o
mundo nerd/geek, música, literatura, e até política. O fandom do canal é
reconhecido pelo título de Nerdfighteria,
onde a comunidade acolhe diversos jovens do mundo inteiro, compartilhando
interesses e vivências.
A
propósito, Hank Green é um dos co-produtores da websérie em questão, fazendo
das citações dele no livro algo como uma “metaprodução” ou “metarealidade”, em
que o próprio produtor é uma “celebridade” dentro e fora da ficção. No vídeo
abaixo, do canal Vlogbrothers, Hank apresentou pela primeira vez a ideia da
série. Traduzimos um trecho para quem não compreende inglês.
Então eu quis fazer
algo que ninguém tinha feito antes, uma adaptação online. Pegar um trabalho
prévio e transferi-lo para essa nova mídia. Não existe... quer dizer, não tenho
referências de isso já ter acontecido. Eu queria algo com uma boa história que
amo, e algo que minha mulher gostaria bastante, e que tivesse muita base de
diálogo e de personagens, para que fizéssemos, não uma grande produção, com
muitos espaços e cenas e tal, mas apenas uma pessoa conversando com uma câmera.
É um trabalho ficcional, adaptado em um vlog. A obra que escolhemos foi
‘Orgulho e Preconeito’, porque, sabe, é a melhor história de todos os tempos. É
um romance maravilhoso, com personagens envolventes, e fico muito instigado por
essa história. E eu não estaria se não fosse pela Katherine (esposa), claro.
Ela é uma grande fã de OeP.
E isso tudo é muito, muito diferente de tudo que já
fiz. Eu prefiro fazer um vlog sozinho, mas o projeto envolve atores, o cara do
som, produtores, escritores, e então organizar essa galera, o que é totalmente
novo para mim. [...] E isso, é realmente contar uma história, tendo que pensar
em como fazê-la, como escrevê-la, como transferi-la para o tempo presente,
porque não é de nosso tempo. É realmente novo e excitante fazer algo diferente
assim.
E, claro, eu não tenho tempo pra isso, mas cá estou eu fazendo do mesmo
jeito, porque fui assim capturado pela ideia. Fico naquela de não saber como
apresentar para as pessoas, porque, eu sei que esse projeto é bom, mas o que
posso fazer para as pessoas realmente assistirem? Nós fizemos 8 episódios, e
pra fazer mais, vamos ter que provar que as pessoas querem assistir.
Honestamente, é complicado, porque é bem distante de qualquer outra coisa na
linha de ficção, e é possível que não seja uma boa maneira de se contar uma
história. Espero que não seja este o caso, não quero que seja este o caso. Se
você não gostar, não tem problema. Considero um experimento extremamente
animador. E é isso que sinto. Espero que gostem.
#entendedoresentenderão
Você
pode acompanhar mais das impressões do Hank neste outro vídeo,
onde ele fala sobre a resposta do público – legenda somente em inglês. Para
fechar essa seção de vídeos, confira aqui
uma filmagem acolhedora dos atores da série, interpretando Hazel e Gus numa leitura
de um trecho de A culpa é das estrelas, de John Green. O encontro especial
comemorava um ano de lançamento do livro e o sexto do fandom Nerdfighteria. De
bônus, um vídeo
do episódio 99 comentado pelos produtores. Não abra esse último se você não
quer spoilers da série! Também não tem legenda em português nestes.
Os
autores
-
Kate Rorick é graduada pela
Universidade de Syracuse e mora em Los Angeles. Escreveu para uma variedade de
programas de televisão (incluindo Law and Order – Criminal Intent, Terra Nova e
The Librarians), bem como escreveu e produziu as webséries The Lizzie Bennet
Diaries e Emma Approved, ambas vencedoras do Emmy Awards nas categorias de
programa interativo. Em seu tempo livre, ela é a autora de best-sellers de
romances históricos sob o nome Kate Noble. Bernie
Su foi o produtor executivo e o redator principal das webséries The Lizzie
Bennet Diaries e Emma Approved. Também atuou como produtor executivo e diretor
da Welcome to Sanditon, além de co-criador de Frankenstein MD e, fora dos
projetos da Pemberley Digital, Bernie foi o escritor e diretor de LOOKBOOK, uma
série dramática roteirizada para a popular rede social fashion LOOKBOOK.com.
Escreveu ainda vários episódios para a série de ficção científica Black Box TV.
Também é conhecido por escrever e criar a série Compulsions, aclamada pela
crítica, vencedora do prêmio Clicker de Melhor Drama Original na Web, bem como
o Streamy Award de Melhor Redação em Série Dramática da Web.
#DarcyDay
e aquele link
-
Para quem está conhecendo a história agora, já consegue acessar os rostos dos
personagens de cara, mas durante o tempo que a série ficou no ar, era tudo um
mistério. A expectativa era grande para alguns personagens, como o Darcy. No
dia 1ª de novembro de 2012, ele fez sua primeira aparição e o fandom “explodiu”
em reação, ficando este dia conhecido como #DarcyDay, marca registrada dos fãs
pelas redes sociais. E aquele link,
que não podemos revelar, relacionado ao personagem Wickham, não só “existiu” (site
falso), como deixou os fãs no chão.
Crossovers
-
Domino, o programa “testado” no enredo do universo TLBD, foi uma introdução da
produção para dar partida na websérie Welcome to Sanditon, adaptação da novela Lady
Susan (Jane Austen) – que não teve o mesmo envolvimento de fãs como na
série da Lizzie. Mas na produção seguinte, Emma Approved – que também foi
premiada com um Emmy Award por Narrativa Interativa – adaptação de Emma
(Jane Austen), o fandom voltou com tudo. Há umas pequenas referências à TLBD e
uma personagem em especial aparece de surpresa.
Kickstarter
e produtos
-
“The Lizzie Bennet Diaries provou que uma história ficcional pode ser contada
através de vídeo blogs. O que virá mais?” – foi assim que a Pemberley Digital
começou uma campanha de financiamento coletivo para arrecadar fundos que
pudessem cobrir gastos da produção e
produtos relacionados à série – como o livro. O financiamento ultrapassou
em mais de 400 mil dólares o objetivo de arrecadamento, fechando em 462 mil
dólares e mais de 5 mil dvds pré-vendidos.
Bloopers!
-
Quem não ama erros de gravação? O dvd oficial reuniu diversos deles, assim como
entrevistas e outras coisitas, mas você pode conferir alguns bloopers ainda no youtube!
Fandom,
legendas e livro
-
O grupo de fãs no Brasil começou pequeno, entre blogueiros, leitores e também
fãs dos irmãos Green. A autora Larissa Siriani foi quem iniciou as legendas,
para auxiliar outros fãs que não conseguiam acompanhar a série em inglês. O
contato contínuo com a produção possibilitou que as legendas fossem acopladas à
série original, de modo que o fandom se uniu e se empenhou em lançar legendas
oficiais, comandadas pela Siriani. A
força do grupo também fez diferença para trazer o livro para o Brasil, que foi
adotado pela editora Verus (adicione no skoob).
E
em homenagem à reprise da série, a Larissa fez uma semana de vídeos especiais.
Está no canal dela (playlist aqui),
com vídeos em inglês e legendas em português!
Dona
Moça
-
Inspiradas pela webséries no formato iniciado pela produtora Pemberley Digital,
um grupo de dentro do fandom brasileiro trabalhou por uma websérie com
adaptação de um clássico nacional. Senhora, de José de Alencar, virou Dona
Moça, da Adorbs Produções (veja entrevista aqui
e aqui).
Para assistir a série, acesse aqui.
Espero que tenham gostado deste universo
e contem-nos mais sobre isso no Clube de Abril!
28/abr – 15h – na Livraria Leitura
(São Luís Shopping)
Entrada gratuita
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